Direito Laboral Desportivo
Extração integral do artigo publicado no Semanário Vida Económica de hoje, 11/02/2022, em
https://www.vidaeconomica.pt/vida-economica-1/publicacoes/edicao-num-1918-do-vida-economica-de-11022021/opiniao/clausulas-de-rescisao-nos-contratos-de-trabalho-desportivo:
"Na celebração de contrato de trabalho desportivo, além das vantagens desportivas que retira do praticante desportivo, a entidade patronal gere as expectativas que detém sobre os interesses económicos do jogador num momento em que este seja transferido para algum outro clube – e que, no limite, como tantas vezes vemos suceder, pode ser zero.
Este é, aliás, o paradigma do desporto profissional português cujos obstáculos na retenção de talento são evidentes.
A entidade patronal procurará encaixar algum valor que contratualmente tenha sido estabelecido mediante a ocorrência de vicissitudes contratuais. A cláusula de rescisão é um desses casos, e que pode ser entendida como uma cláusula através da qual se confere ao praticante desportivo o direito de denunciar o contrato antes do seu termo, através do pagamento de um preço.
Pode também acontecer, por vezes, que o pagamento dessa compensação é feito a favor de outras entidades que não o empregador.
Naturalmente, esta particularidade é específica da relação laboral desportiva, pois que, no contrato de trabalho comum, nenhuma empresa recebe qualquer montante no momento em que o seu colaborador cessa o seu contrato de trabalho, pelo que este é um elemento característico importante na relação de trabalho desportiva – a vertente económica, não sendo essencial, é inerente a este tipo de contrato e é o que distingue o contrato de trabalho desportivo do um contrato de trabalho comum.
Na relação laboral desportiva, o praticante não pode desvincular-se livremente antes da verificação do termo, a menos que o clube que tem o registo a seu favor, isto é, o empregador que é detentor dos direitos desportivos, disso prescinda. Por isso, (o registo do contrato e de que não nos iremos nesta pequena análise ocupar e) a cessação da relação laboral é, ao fim e ao cabo, uma grande especificidade da relação laboral desportiva.
Se do contrato de trabalho constar uma cláusula de rescisão (em rigor, uma cláusula liberatória) que preveja o términos das obrigações laborais mediante o pagamento de uma compensação ao empregador, contanto que essa compensação seja colocada à disposição, o atleta pode sair livremente dessa relação laboral e fazer terminar o registo federativo – é livre de assumir compromissos com outro empregador. Mas se o trabalhador, o praticante, pretende terminar a relação de trabalho, não tem qualquer justa causa que lhe permita terminar o contrato com esse fundamento e não tem como ou não quer pagar a compensação devida referente à cláusula liberatória, não poderá, simplesmente, terminar a sua relação laboral.
A lei prevê as formas (lícitas) da cessação dos contratos de trabalho desportivo ao elencá-las no Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo (RJCTPD): e além das caducidade, condição resolutiva, revogação e procedimento disciplinar, é de destacar a denúncia, e é esta denúncia que vulgarmente se tem denominado de rescisão.
O montante a entregar ao empregador deve estar determinado ou, pelo menos, ser determinável, já que, caso não existindo menção a uma ou a outra coisas, estaremos perante uma nulidade nos termos gerais de Direito.
E uma nota não menos importante relativamente aos valores astronómicos que muitas destas cláusulas alcançam: pode entender-se que, se as cláusulas de rescisão comportarem valores desproporcionados, estaremos a limitar despropositadamente a liberdade do trabalhador quanto ao exercício do seu direito de denúncia e, por esse motivo, poderá fazer sentido, com recurso ao princípio da equidade, procurar reduzir esse valor.
Para tanto, sempre se prevê ser necessário recorrer aos meios judiciais."